É domingo a tarde, chove muito e a chuva tamburila firme e forte sobre as tabuinhas de madeira de pinho lascada… toda a casa é feita de tábuas de pinheiro lascado, eu e meus irmãos estamos impacientes, presos nos limites da casa…
– Mulher, piazada, vamos rezar o terço! – è a voz de papai que faz o convite.
– Você não vai a capela? – Pergunta mamãe, com ares de surpresa.
– É muita chuva e me deu preguiça – responde papai enquanto puxa a cadeira com assento de palha trançada, para ajoelhar-se, apoiado nela. Cada um em sua cadeira, todos ficamos ajoelhados diante da mesa de refeições, atrás da qual podia-se ver quadros e figuras de santos.
O quadro que mais me impressionava, era um grande quadro, uma grande figura de Santo Antônio de Pádua, com o menino Jesus no colo .
Muitas vezes havia me perguntado porque o menino Jesus aparecia no colo de Santo Antônio?
Sim, papai já me havia explicado que Santo Antônio conversava com os peixes, que ficava em pé por cima da água… Não sei bem por que; porém, eu sabia que Jesus tinha vindo a esse mundo, muito antes de Santo Antônio.
Eu me distraí, ouvindo o barulho da água forte e suja do Rio Cascalho, atrás de casa. Era a enchente, como as pessoas comentavam.
– Pedrinho, reza direito! – Era o pai chamando-me a atenção.
E a voz de papai ressoou poderosa aos meus ouvidos:
“Ave Maria, cheia de graça, o senhor é convosco. E bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto de vosso ventre, Jesus.”
“Santa Maria mãe de Deus…” todas as nossas as nossas vozes pareciam amplificadas…
Eu novamente me distraía meditando: “O fruto do vosso ventre, Jesus” “Fruto vem da árvore… Jesus é fruto da mãe de Deus? O que é ventre?”
Terminada a reza do terço, todos fomos olhar o rio, que dava pra vê-lo da janela. Como estava cheio!…
Sim, eu lembro e muito bem, numa missa o Padre disse que Jesus havia acalmado a tempestade, que poderia ter virado o barco, no qual estavam Jesus e seus amigos…
Papai e mamãe estavam muito preocupados com a chuva que não parava. E Lírio, meu irmão mais velho, de sete anos, andava nervoso, indo da cozinha para os quartos e dos quartos para a sala.
Começava a escurecer, quando um relâmpago ilumina a casa e um trovão sacode o céu e faz estremecer a casa…
Depois do jantar, mamãe deita o Nelson na cama. Ele com medo, tinha adormecido em seu colo. Mandou eu e Lírio dormir também…
Mudos, Lírio e eu, entramos embaixo das cobertas… não trovejava mais. Mas o barulho da chuva e do rio continuam…