Quando vem o frio,
Quando a geada estende seu lençol branco,
Quando um ventinho delido costa as faces,
Inevitavelmente
Recordo os meus tempos de menino, casaco apertado, tamancos rudes, o calor do fogo e o frio da manhã.
Tempo de frio é tempo de plantar trigo.
Terra preparada. Odor acre de solo fértil, de mistura, às vezes, ao cheiro de arbustus queimados.
Papai semeando os grãos.
O arado removendo a terra.
As enxadas retocando o trabalho arado.
Então, a semente que eu via caindo sobre a terra, a semente que eu sentia sendo enterrada, carregava consigo um lindo sonho. O sonho das folhas verdes, espadas de esperança rasgando o solo promissor.
Depois as folhas iam subindo – e o sonho crescendo.
As espigas anunciadas e a esperança enriquecida. Esperança banhada de alegria. Sonho e certeza dando nó na garganta .
O sonho dos trigais ondulantes e dourados, carregados da maior riqueza de um pobre lavrador.
Ai, sentindo o frio cortando as faces,
O odor da terra penetrando as narinas,
Os grãos navegando – olhar a dentro,
Um sonho desfilando pelo cérebro,
Eu via tudo com um peso no coração,
Um peso que era uma dor suave e um sofrimento alegre.
Era toda a minha torcida para que aqueles grãos se multiplicassem em vasta seara, e a máquina viesse, triturando palha e derramando sacos e sacos de trigo.
O meu sonho era grande, o meu desejo imenso, a minha torcida sem igual.
Quero ver o rosto de meu pai se abrir num largo sorriso.
O rosto de meu pai desabrochando em alegria: o meu maior contentamento, minha felicidade de menino pobre, sentindo a pobreza estreitando tenazes em todos os lados.
Não me assusta o frio. O trabalho não mete medo.
Sinto uma coragem imensa para lutar junto com meu pai, ao lado de minha mãe e meus irmãos.
Eu quero
Eu sonho vê-los felizes.
***
Hoje o frio assobia pelas paredes da casa e eu revivo um sonho. Vejo os lindos trigais carregados de espigas e de sonhos, de espigas e de esperanças,
De espigas e de felicidade.
Esses trigas que meus filhos não haverão de ver como eu vi.
E a saudade se faz maior; pois tenho saudade
Da saudade que meus filhos não terão.
Pedro A. Grisa
Canoinhas/SC – 1976.